O princípio da presunção de inocência que também é conhecido como princípio da não culpabilidade, tem como base a questão de que a pessoa é inocente até que se prove o contrário. A presunção de inocência é extremamente relevante na vida das pessoas e sobretudo, no Processo Penal, por estar relacionada com a liberdade._
O princípio da presunção de inocência também pode ser entendido como due process of law e representa um ato de fé nos valores éticos das pessoas, próprio de toda sociedade livre. Estrutura-se no reconhecimento dos princípios do direito natural como fundamento da sociedade, princípios que, aliados à soberania do povo e ao culto da liberdade, constituem os elementos essenciais da democracia. (Tourinho Filho, 2024)
Criar e manter os pressupostos elementares de uma vida na liberdade e na dignidade humana é o que os direitos fundamentais almejam. Os direitos fundamentais são, em sua essência, os direitos do homem livre e isolado, direitos que ele possui em face do Estado. Se trata dos direitos da liberdade da pessoa particular e estão relacionados à dignidade humana, mas devem respeitar os limites legais. (Paulo Bonavides, 2018)
De acordo com o autor, a primeira manifestação desses direitos se deu na França com a Declaração dos Direitos do Homem em 1789. O princípio da presunção de inocência estava no artigo 9º da Declaração dos Direitos do Homem, 1789, França, onde é dito que “todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda de sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”.
O princípio surgiu em meados do século 18, século das luzes ou Iluminismo, quando começaram a aparecer ideias humanitárias, onde tiveram destaque Montesquieu, Voltaire, Locke e Rousseau e a liberdade passou a ser tida como condição necessária para a vida na comunidade e sociedade.
Durante o Iluminismo um jovem italiano, Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, lançou em 1764 um livro que revolucionou o mundo: “Dos Delitos e Das Penas”. O livro foi tão importante que fez o rei da Suécia e em seguida, a rainha da Rússia abolirem as torturas. Depois foi Maria Thereza do império austríaco e assim por diante, as torturas foram sendo abolidas.
Inspirados nas ideias iluministas e nos ideais da Constituição Norte Americana, o povo francês, constituído em Assembléia Nacional, resolveu reconhecer e declarar os direitos do homem e do cidadão após a Revolução Francesa. (Tourinho Filho, 2023)
Em 1948 a Organização das Nações Unidas proclamou em Paris a Declaração Universal dos Direitos Humanos defendendo o mesmo ponto de vista e em seu artigo 6º da Convenção Européia dos Direitos do Homem e do Cidadão, novembro de 1950, falava: “Toda pessoa acusada de um crime será presumida inocente até que seja declarada culpada de acordo com a lei”.
Em novembro de 1969 foi feito o Pacto de São José da Costa Rica, sendo que o Brasil aderiu ao mesmo apenas em 1992. Neste Pacto temos o seguinte: “Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se comprove legalmente sua culpa.”
Vemos então o princípio da presunção da inocência surgir. Enquanto não for definitivamente condenado, o réu será presumido inocente.
De acordo com Tourinho Filho (2024), uma vez sendo o sujeito presumidamente inocente, sua prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória implicaria na antecipação da pena e não se pode punir ninguém antecipadamente, antes de ser definitivamente condenado, a não ser que a prisão seja indispensável por motivo de cautela.
Sendo assim, uma vez que o réu é condenado, independentemente de ser primário, reincidente, ter bons antecedentes, se estiver se desfazendo de seus bens ou mostrando que pretende fugir, neste caso justifica sua prisão provisória. Do contrário não justificaria. No caso do réu estar perturbando a instrução criminal também justifica sua prisão, caso contrário não.
Em 2016 a Suprema Corte passou a considerar que o réu condenado em segunda instância já poderia ter sua pena executada. Poderia ser executada, desde que tenha havido trânsito em julgado.
O trânsito em julgado ocorrerá quando não houver mais recurso a ser interposto. Sempre que ainda couber recurso não haverá trânsito em julgado. Condenado o réu, desde que não haja recurso nem por parte da defesa, nem por parte da acusação, a pena é executada.
Segundo Tourinho Filho (2023), no caso de haver apelo e o Órgão de Segunda Instância mantiver a condenação, a defesa pode ainda opor embargos declaratórios e, no caso da decisão não ser unânime, ainda pode haver os embargos infringentes ou de nulidades. No entanto, não cabendo esclarecimento, é preciso indagar se a decisão da 2ª instância afrontou a lei federal ou tratado. Caso isto ocorra, é cabível o recurso especial. Se não couber recurso especial ainda é preciso indagar se a decisão feriu a Constituição. No caso de não ter havido ofensa à Magna Carta, o trânsito em julgado ocorreu na 2ª instância.
O princípio da presunção de inocência também é conhecido como princípio do estado de inocência ou da não culpabilidade e defende a ideia de que as pessoas nascem inocentes e que este é o seu estado natural, justamente por este motivo, cabe ao Estado evidenciar com provas suficientes a culpa do réu. Este princípio defende que o ônus da prova cabe à acusação e não à defesa. Também confirma a necessidade e excepcionalidade de medidas cautelares de prisão, uma vez que pessoas inocentes só podem ser presas quando isto realmente for útil à instrução e à ordem pública. (Nucci, 2008)
Nucci (2008) também acrescenta ao princípio a prevalência do interesse do réu (in dubio pro reo), ou seja, no caso de haver dúvidas, o que deve prevalecer será sempre a condição de inocência do réu, absolvendo-se o acusado. Temos também a questão do princípio penal da intervenção mínima do Estado na vida das pessoas, pois a sanção penal só deverá atingir aqueles que realmente forem culpados e, por fim, temos a questão de que ninguém é obrigado a se auto acusar, as pessoas têm direito ao silêncio.
De acordo com Renato Brasileiro (2011), em nosso ordenamento pátrio, até a Constituição de 1988 entrar em vigor, o princípio da presunção de inocência era apenas implícito. Este princípio passou a constar expressamente no artigo 5º, inciso LVII da Constituição: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Isto quer dizer que a pessoa tem o direito de não ser declarada culpada, a não ser que haja uma sentença transitada em julgado, quando terminar o processo legal, onde o acusado se utilizou de todos os meios de provas para se defender (ampla defesa) e de todos os meios para destituir as provas apresentadas contra ele (contraditório).
O texto da Constituição é mais completo e abrangente do que o das Convenções, pois estende a presunção de inocência até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos vai só até se comprovar a culpa do réu.
Vitor Graçano (2020) atenta para o fato de que o princípio da presunção da inocência não era obedecido no Brasil, podemos dizer que a adesão de nosso país junto à Organização das Nações Unidas, àquela declaração, foi praticamente diplomática.
Depois de 1988
Depois da Constituição de 1988, portanto, passou a se fazer necessário o acusador demonstrar a culpabilidade do acusado, demonstrar a existência de fatos concretos e essas demonstrações precisam ser feitas de forma concreta, as comprovações devem ser feitas legalmente e o acusado não é obrigado a colaborar na apuração dos fatos, tendo direito ao silêncio. (Renato Brasileiro, 2011)
A regra do in dubio pro reo deve ser utilizada sempre que houver dúvidas sobre algum fato ou circunstância relevante na decisão do processo. Em se tratando de matéria penal, estamos falando da vida, da liberdade de uma pessoa, justamente por isso, antes de uma sentença condenatória é necessário que se prove realmente que a pessoa cometeu o crime, eliminando qualquer dúvida possível que haja, garantida pela presunção de inocência.
A lei impõe a presença de indícios suficientes que comprovem a autoria ou participação na prática delituosa, havendo dúvidas deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo. Importante dizer que o in dubio pro reo só incide até o trânsito em julgado de sentença condenatória.
Estar preso no curso do processo é exceção, pois isso se justifica apenas em poucas situações, uma vez que a regra é responder ao processo penal em liberdade.
Devido a regra de tratamento, que vêm do princípio constitucional da presunção de inocência, o Poder Público está impedido de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao denunciado, ao acusado, ao indiciado, como se estes já houvessem sido condenados, de forma definitiva, enquanto não houver sentença condenatória com trânsito em julgado.
De acordo com o artigo 5º, inciso LVII da Carta Magna, 1988, não há impedimento para a decretação de prisão antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, desde que a prisão cautelar não perca seu caráter excepcional e se mostre realmente necessária no caso concreto.
No caso de o acusado ter que permanecer preso antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, devido à alguma hipótese que permita a prisão preventiva, não há impedimento para a concessão antecipada dos benefícios da execução penal definitiva ao preso cautelar. Tendo em vista que já tenha ocorrido o trânsito em julgado da sentença condenatória para o Ministério Público, mas ainda há pendência de recurso da defesa, a pena imposta ao acusado não poderá ser agravada (artigo 617, Código de Processo Penal (BRASIL. Decreto — Lei nº 3.931, de 11 de dezembro de 1941).
É admitida, no entanto, a concessão antecipada de institutos como progressão de regime e outros incidentes da execução. Isso ocorre, pois nesses casos não há violação do princípio da presunção de inocência, uma vez que não se trata de execução provisória, mas sim, de adiantamento de circunstâncias de ressocialização àquele que está detido por razões cautelares.
Por fim, é importante dizer que no caso de haver algum equívoco, o Estado não irá indenizar o réu pelo tempo que este for privado de sua liberdade. É preciso que haja certeza, pois é melhor termos uma pessoa culpada absolvida do que termos um inocente preso, o erro é menos grave e pode ser corrigido._